Olhos Azuis/Olhos Castanhos
Atenção: Peço aos leitores de olhos azuis que deixem, imediatamente, de ler este texto.
Bem-vindos, amigos de olhos castanhos, verdes, e afins.
Agora que estamos na companhia dos nossos pares – e sem a possibilidade dos “outros” virem conspurcar a nossa conversa – falemos abertamente sobre o que deve ser feito para contrariar a crescente tendência para a confraternização entre “azulados” e pessoas de bem.
Será por aqui que a minha fachada cai por terra.
A todos os que estavam, de fato, à espera de continuar a discussão acima mencionada, espero que estejam, neste momento, a reconsiderar todas as escolhas de vida que vos fizeram chegar a este ponto.
Aos restantes, deixem-me que vos apresente, ou relembre, a famosa experiência social feita por uma professora primária Americana na década de 1960 e que despoletou tantas críticas negativas como louvores fervorosos.
No rescaldo do assassinato do Dr. Martin Luther King, Jane Elliott propôs à sua turma do terceiro ano uma experiência para que os seus alunos – todos eles brancos – pudessem sentir na pele o que é ser discriminado por uma característica física, impossível de alterar.
Depois de separar todas as crianças de olhos azuis das restantes (de olhos castanhos e verdes) e de as obrigar a usar braçadeiras, que as identificavam como diferentes, a professora começou a enumerar todas as qualidades das pessoas com olhos castanhos: “são melhores pessoas,” “são mais limpas e espertas,” etc., oferecendo explicações falsas, mas cientificamente plausíveis.
Os comportamentos discriminatórios entre os alunos rapidamente se fizeram sentir; surgiram acusações de que os “azulados” poderiam ter doenças estranhas e que o melhor seria não haver ajuntamentos.
Foi também denotada pela professora uma maior confiança, e consequente aproveitamento escolar, por parte dos alunos da “classe superior”.
Dias depois, a experiência foi repetida mas com os papéis invertidos. Compreensivelmente, os alunos de olhos azuis foram mais benevolentes com os seus colegas; provavelmente, por terem sentido na pele as consequências de um ostracismo injusto.
Concluída a experiência, a professora Elliott ficou satisfeita com a aparente consciencialização dos seus pupilos, e a notícia rapidamente se espalhou pela cidade e depois pelo mundo. Mas, não sem a sua quota-parte de criticas.
Se havia vozes furiosas a defender a honra das crianças envolvidas, havia também os que recorreriam à violência contra Jane e a sua família.
Ainda assim, esta professora reformada acabou por fazer carreira a conduzir este seu exercício pelas mais diversas instituições mundiais e continua, até aos dias de hoje, a divulgar a sua mensagem contra a discriminação.
E quer concordemos ou não com o método utilizado – principalmente, por se tratarem de crianças tão novas – a verdade é que a luta contra o racismo precisa de menos slogans bonitos e de mais acções com resultados concretos.
Lesson of a Lifetime – Smithsonian Magazine
Imagem: By Karen Arnold - http://www.publicdomainpictures.net/view-image.php?image=42302&picture=eyes-of-woman-clipart, CC0, https://commons.wikimedia.org/w/index.php?curid=31247438