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Em Letras Pequeninas

Podem tirar a rapariga da farmácia, mas não podem tirar a farmácia da rapariga. Salvo seja…

Em Letras Pequeninas

Podem tirar a rapariga da farmácia, mas não podem tirar a farmácia da rapariga. Salvo seja…

27 de Outubro, 2025

Vida de Aldeia

Inês R.

Um concerto na capital é um evento para o qual se tem de planear com alguma antecedência, é verdade. Há que pedir para sair mais cedo do trabalho e tirar a manhã seguinte de férias; arranjar quarto para passar a noite, não muito longe do recinto; e ainda somar os custos com combustível (ou transportes públicos) e alimentação ao dos bilhetes. 

Mas não há nada que pague a vidinha de aldeia.

Onde conduzes com a mão que não tens de levantar a cada 500 metros, a caminho da tua casa de família, na rua onde sempre moraste, e aonde chegas ainda a tempo de regar a horta e trocar dois dedos de conversa com o Zé que ficou de te emprestar as redes para a azeitona depois de acabar a apanha dele. 

Onde bebes o teu café da manhã no mesmo tasco onde paras depois de despegar para beber uma mini com a malta e ficas a saber que a Sónia do Manel está de bebé e a dona Arminda tem cá o filho da França.

É também onde as tuas falhas (muito mais que os teus sucessos) chegam aos ouvidos da tua mãe antes de teres a possibilidade de lhas contar e uma janela aberta tanto traz cheiro de flores e terra molhada quanto de queimadas e gado.

Onde vês a filha da vizinha levar uma Sagrada Família pela mão, para a deixar na próxima casa da lista; de onde sairá dois dias depois - de caixa de esmolas mais pesada -, a caminho de outra sala de estar para abençoar, e tu soltas um supiro porque nada muda. Mas aquela miúda - de certo, deserta para ir ao Bolinho no primeiro de novembro - vai crescer, perceber que há mais vida para além da missa e deixar a religião, porque nada muda. E ainda bem.

20 de Outubro, 2025

Se o sapato de vela servir...

Inês R.

O cabelo, de risco ao lado, estava descoberto; nem um cap da Lacoste, nem um boné da Sacoor Brothers por perto. Os Ray-Ban adornavam-lhe o decote, enquanto resguardava o rosto da bola de espelhos com a mão que não segurava o Whiskey-Cola. Por entre o vidro escurecido vislumbrava-se um único pêlo, que terá fugido aos botões do polo azul bebé com o logótipo do senhor a cavalo. Apenas os chinos, em bege claro, escondiam a modéstia que não tinha, das moças que enganava com o seu Hugo Boss Mãozinhas. Ainda assim, teria sido uma sessão parlamentar mais bem conseguida se dedicada aos perigos, de fato, reais dos predadores nativos das pistas de dança nacionais.

13 de Outubro, 2025

Ao cuidado do Sr. SPAM

Inês R.

Há dias tive de explicar aos meus pais que o SPAM não era um único indivíduo que, qual Pai Natal da dark web, conseguia visitar milhares de telemóveis num só dia. Ainda assim, foi bom perceber que eles - fazendo parte da geração que ainda receia tudo o que é tecnologia - têm um tal pânico de interagir com telefonemas, mensagens, ou alertas que não reconhecem que dificilmente cairão num qualquer esquema de phishing

Mas tal não é verdade para muitas pessoas. Entre o esquema das mensagens "olá pai/olá mãe," telefonemas em que uma voz robótica nos confirma a receção do nosso currículo, e sms's a pedir a confirmação dos nossos dados (seja para receber encomendas, poder continuar a utilizar o nosso cartão de débito bancário, ou liquidar uma coima do Serviço de Finanças), é, perfeitamente, compreensível como é que os Portugueses perdem milhões de euros, todos os anos, para este tipo de fraude.

Principalmente, se estivermos a falar de um idoso que não tenha quem o ajude a identificar contatos maliciosos ou que nem sequer perceba estar perante uma situação em que o deva fazer. 

E com a crescente tendência para a digitalização de todos os processos e serviços, parece-me que será inevitável que estes casos continuem a acontecer em grandes números. A solução passará sempre por tentar alertar e educar o maior número de pessoas possível; nem que seja apenas os nossos familiares e amigos. 

Tudo isto me faz pensar que seria, efetivamente, mais conveniente que SPAM fosse a alcunha de um gajo qualquer que pudesse ser apanhado em flagrante pela polícia judiciária a mandar whatsaapps da cave de casa dos pais, e que, enfim, pudessemos todos deixar de ter uma apoplexia de cada vez que recebemos uma chamada de um número desconhecido.

06 de Outubro, 2025

Sugestões para Atividades em Família

(quando é domingo de eleições)

Inês R.

Fazer uma Caminhada

É de manhã que se começa o dia! Porque não acender a luz da cozinha, tomar o pequeno-almoço pela fresquinha, vestir o fato de treino, e levar todos os membros da família maiores de idade numa caminhada até às urnas? De voto, entenda-se. Dali, é só continuar num percurso da sua escolha e, quem sabe, aproveitar para fazer uma refeição ao ar livre antes de regressar a casa para umas horas de meditação até ao início da noite eleitoral.

Dia de Preguiça

E acordar lá pelas dez de meia (levantar pouco depois das onze), tomar um pequeno-almoço almoçarado, e ficar de pijama no sofá a consumir porcarias e conteúdo que enriquece o espírito (e pouco mais), ali até essas cinco (seis, vá) da tarde? Altura em que será indispensável trocar de roupa (ou vestir um sobretudo por cima da t-shirt das Tasquinhas de Vale dos Burros 2004) e dirigir-se à mesa de voto onde está inscrito para cumprir com o seu dever cívico. Depois, por mim, até pode ir rever a saga Star Wars por inteiro e saber dos resultados das eleições pelas redes sociais na manhã seguinte.

Experiência de Cozinha

Que tal tentar aquela receita de família que leva doze horas a preparar, mais cinco a cozinhar, e que precisa de, pelo menos, três sub-chefes? (Mas que a nossa tia-avó fazia sozinha todos os Natais, domingos de Páscoa e restantes feriados religiosos). Depois de arrumar a cozinha e guardar as sobras em tupperwares (e caixas de gelado), nada melhor que ir a pé até à antiga escola primária para votar e remoer o almoço - não necessariamente por essa ordem. Tudo seguido por uma valente sesta, até porque a noite se avizinhará longa.

Estreitar Laços de Família

E se desligasse o wi-fi lá de casa e fizesse um esforço maior para conhecer a malta que co-habita consigo (e que partilha do seu ADN)? Se conversar à moda antiga estiver fora de questão, sugiro que procure no sótão, ou por cima dos guarda-fatos, por jogos de mesa em que não toca há mais de uma década, e, todos juntos, tentem perceber as regras (ou inventar novas). Se forem particularmente, competitivos, façam por ir votar antes de começar a jogar. Imagine que a polícia e as ambulâncias só se vão embora depois das sete...

Nota: todas as atividades sugeridas foram propositadamente escolhidas para garantir a proximidade da mesa de voto do (e)leitor