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Em Letras Pequeninas

Podem tirar a rapariga da farmácia, mas não podem tirar a farmácia da rapariga. Salvo seja…

Em Letras Pequeninas

Podem tirar a rapariga da farmácia, mas não podem tirar a farmácia da rapariga. Salvo seja…

30 de Junho, 2025

Humanidade Condicional

Inês R.

Li, algures pela internet, que assim que decidimos que uma qualquer categoria de pessoas pode ser tratada como menos do que humana estamos a dizer que a humanidade é condicional; que é preciso fazer check num determinado número de caixas para levar o certificado para casa.

Relacionei-me, imediatamente, com o conceito, até que imaginei aquela categoria de malta que serve de exemplo para todos os argumentos preconceituosos que conheço: os criminosos.

Será que o mais vil dos assassinos também merece ser tratado com empatia?

Sim, claro. 

O seu castigo é a sua remoção da sociedade; são os anos, as décadas, de isolamento e de distância de tudo e de todos. Nada disto implica um tratamento desumano. Um prisioneiro deve ser alimentado, ter acesso a cuidados de higiéne e de saúde (incluindo mental), porque, acima de tudo, se trata de uma pessoa, e porque a intenção (ainda que teorética) da sua prisão será sempre a reabilitação.

Então, se até um bandido é um ser humano, porque custa tanto aceitar que uma diferença de religião, de orientação sexual, ou de cor de pele não retira a humanidade a ninguém?

23 de Junho, 2025

Sobre (In)Ação

Inês R.

Não são os sacos com embalagens de plástico, papel e vidro que eu levo para o Ecoponto todas as semanas que vão inverter as alterações climáticas, eu sei disso. Mas este meu esforço de há décadas não é em vão, porque, pelo menos, garanto que aquele plástico não vai passar centenas de anos a decompor-se num aterro e aquele vidro e papel serão reutilizados.

Pela mesma ordem de razões, e sempre que posso, faço pequenas doações a instituições (como a UNICEF) que ajudam pessoas, e em especial crianças, em situação de guerra. Aqueles dez ou vinte euros podem não garantir a sobrevivência de ninguém, mas podem ser a diferença entre um dia mau e um dia mau com uma refeição quente.

Agora, sabendo que os donativos em dinheiro não estão ao alcance de todos - até porque temos uma porção significativa da população a viver em pobreza, ou no seu limiar - deixo algumas sugestões para quem queira tentar fazer alguma diferença na vida destas pessoas:

- o simples ato de partilhar formas (fidedignas) de ajudar garante que as iniciativas tenham um maior alcance;

- o "jogo" Free Rice, do World Food Programme das Nações Unidas, que permite doar grãos de arroz por cada x respostas certas;

- exigir ação da parte do nosso governo, enquanto estado soberano e membro da União Europeia, participando em manifestações, protestos, abaixo-assinados, ou outros movimentos, que possam ter efeitos na escalada dos conflitos;

- procurar informação credível sobre as situações políticas por detrás das guerras (por exemplo, seguindo diferentes agências/fontes de notícias nacionais e internacionais nas redes sociais) e partilhá-la, seja com os "amigos" do Facebook, no grupo de Whatsapp da família, ou com um colega de trabalho na pausa do café.

É humano o sentimento de impotência que segue as reportagens diárias de morte e destruição, mas a decisão de como lidar com ele é sempre nossa.

16 de Junho, 2025

Surfar a Onda de Calor

Inês R.

Conselhos práticos para o Português a braços com temperaturas na ordem dos "credo, que não se pode, menina!":

1 - Evitar a exposição direta ao sol e beber muitos líquidos não açucarados (e não alcoólicos, claro);

2 - Dormir na rua (ou na varanda, vá) sempre que possível (a menos que goste de dormir nu);

3 - Trabalhar em locais climatizados (a potencial necessidade de mudar de profissão está implícita);

4 - Emigrar para um país com temperaturas mais normais, digo, amenas (se o conseguir encontrar);

5 - Abandonar este plano mortal e adotar uma existência espectral, caso saiba como o fazer de forma temporária (estou a perguntar para um amigo).

E boa onda de calor!

 

09 de Junho, 2025

Mulher Local Passa-se da Boina

Inês R.

Foi pelas 16:42  de segunda-feira que Maria (nome, suficientemente, genérico para poder ser qualquer uma de nós), depois de ouvir que "as mulheres têm menos resistência à dor" de um comercial de material informático que estava só de passagem, "perdeu a cabeça".

Segundo o testemunho de vários colegas de trabalho homens, a mulher teria passado todo o dia "com cara de que todos lhe devem e ninguém lhe paga" e acabado, "como já estavam todos à espera," a chorar na casa de banho.

"Devia 'tar com o período, ou quê. Ia-me arrancando a cabeça quando lhe disse para sorrir mais," relatou um colega de gabinete, que nos facultou o nome completo e número de segurança social, mas que a nossa redação preferiu manter no anonimato.

Gravações do circuito interno de video-vigilância da empresa deixaram perceber que o dia até começou bem para aquela rececionista de 34 anos. É possível vê-la a partilhar um vídeo "engraçado" com uma colega, junto à entrada do edifício, momentos antes do chefe de departamento as abordar com uma mão no ombro de cada uma e acabar, de imediato, com a boa disposição do grupo.

Mas, a partir dali, os relatos do dia são muitos e variados.

Segundo (todas) as mulheres que assistiram ao momento, Maria apenas se levantou, repentinamente, da cadeira, dirigiu-se a passos largos para a casa de banho, e tirou alguns minutos para libertar a tensão e, depois, para se recompor, antes de regressar ao seu posto de trabalho.

Ainda assim, uma fonte próxima do departamento de recursos humanos da empresa garantiu-nos que a colaboradora ficou "debaixo de olho," o que não o surpreendeu porque, segundo o mesmo, "tem de haver ali qualquer coisa que não bate bem". Questionado sobre o que queria dizer com aquela afirmação, não hesitou em apontar o estado civil da colega como a sua principal razão: "Se nenhum homem a quer, faça você as contas..."

Assim que a nossa reporter apontou o quão tendenciosa tinha sido a sua observação, este acusou-a de ter ficado "histérica" e de "não saber ouvir uma piada," tendo a entrevista terminado por ali.

À hora de fecho da nossa edição, tínhamos, já, recebido centenas de contatos de homens que conheciam, trabalhavam ou tinham trabalhado, frequentavam o mesmo ginásio, faziam o mesmo percurso para o trabalho, já a tinham visto "por aí," ou que "conhecem bem gajas como Maria," a querer colaborar com a investigação. Todos os pedidos foram educadamente rejeitados.

02 de Junho, 2025

Escorpião, com ascendente em lógica

Inês R.

Se escolheu ler esta publicação, e até gosta de passar os olhos pelas previsões da semana, saiba que isto não é, de todo, um ataque à sua forma de viver a vida. Já se o seu signo do Zodíaco e respetivo ascendente, figuram no seu perfil de Instagram, é capaz de não querer ler o resto do texto... 

É certo que não vem mal nenhum ao mundo por se espreitar um horóscopo de revista cor-de-rosa, enquanto se espera por uma consulta de dentista - ainda que seja numa edição com mais de seis meses. 

Mas também não há evidência alguma de que aquelas recomendações tenham fundamentação (muito menos científica - a almofada em que dormimos tem mais influência na nossa cabeça do que a lua) e eu tenho por hábito não gostar de malta que ganha a vida a vender banha da cobra a pessoas fragilizadas.

Sou, portanto, uma não-crente que vive feliz a ignorar a Astrologia.

99% do tempo. O outro 1% são todas as situações em que eu me sinto pessoalmente atacada quando ouço cascar em Escorpiões. (Porque, sim, não vivo debaixo de uma pedra e sei qual é o "meu" signo.)

Ora, o meu lado racional sabe, perfeitamente, que nada daquilo tem qualquer validade, mas a minha necessidade de agradar detesta saber que o dia (e hora) em que nasci - e sobre o qual não tive nenhuma responsabilidade - possa definir as minhas relações interpessoais, antes mesmo de eu abrir a boca.

Chamem-me conservadora, mas se alguém não for comigo à bola, eu prefiro que seja porque eu disse ou fiz algo que a tenha antagonizado, e não porque me foi atribuído um conjunto de características inventadas por pessoas que "viram" figuras míticas no céu nocturno (como crianças a olhar para as nuvens) e lhes deram um significado.

Mas se se estão, neste momento, a perguntar por que raio estou a falar disto, com tudo o que está a acontecer no mundo, têm toda a razão. O ambiente político, económico, social... está tudo de pernas para o ar. E o que é, deveras, importante é tentar perceber como as pessoas são levadas pelo medo a acreditar em falsidades que não lhes trazem nada de positivo para as suas vidas.

Às tantas, estou com o Mercúrio em retrógrado, ou assim...