Cada geração tem a sua versão, que considera a definitiva e defende até à morte (leia-se cancelamento nas redes).
Nos "bons velhos tempos" da malta da minha idade andava-se de carro sem cintos de segurança, uma adolescente podia ir comprar um SG Gigante para o pai (porque lho vendiam!), uma grande parte das mulheres adultas era "dona de casa" ou "mulher a dias," e o conceito de saúde mental só existia no dicionário.
Se tenho boas memórias da minha infância - que as tenho - não faço delas uma bandeira e muito menos considero que a evolução das sociedades seja algo, intrinsecamente, negativo.
Posso olhar para o mundo que me rodeia e apontar todos os problemas que o afetam (que são muitos e variados!) e, ainda assim, celebrar todas as vitórias que alcançámos enquanto espécie.
Porque nos bons atuais tempos um seropositivo pode viver décadas com uma carga viral tão baixa que não é infecciosa, a violência doméstica e o abuso sexual de menores são crimes públicos, há mais mulheres no ensino superior do que homens, e qualquer pessoa com um telemóvel e uma ligação à internet pode tentar seguir os seus sonhos.
Portanto, não, não precisamos de "tornar os tempos bons, de novo," apenas temos que tentar que sejam melhores.
O meu batismo em ficção Coreana aconteceu, recentemente, com A Mulher da Mala (The Trunk), uma série da Netflix, e fez de mim uma devota sincera (ainda que não-praticante - leia-se das que só vai à missa em dias de festa).
A premissa era suficientemente estranha para me fazer engelhar o nariz noutra altura qualquer (que não a meio da chata preparação para um exame ao sistema digestivo): para o castigar, uma mulher divorcia-se do marido e contrata uma agência de casamentos para lhe arranjar uma esposa de substituição que irá viver com ele durante um ano inteiro. Paralelamente, sabemos que a polícia se encontra a investigar um homicídio - ainda que não saibamos de quem - e que há uma mala de viagem, caríssima, metida ao barulho, que acaba por trazer à superfície toda esta novela.
Se estão já todos a prever que o tiro lhe vai sair pela culatra, então, têm toda a razão, ou não fosse a série considerada um drama-romance-mistério.
Não vou estragar o final a ninguém, até porque não é tão previsível quanto possa parecer, mas a graça está, mesmo, em conhecer estas personagens; perceber os motivos daquela esposa desesperada, as fraquezas de um marido que aceita o impensável, e os segredos da noiva de aluguer no seu quinto casamento, assim como os detalhes do argumento que se cruzam de forma conveniente, sim, mas também bastante satisfatória.
Agora, para além do enredo, devo destacar a cultura Sul-Coreana que, longe de ser perfeita, foi uma parte fundamental do que me prendeu à história.
Os chinelos de andar por casa são uma constante em todas as cenas passadas nas residências das personagens e à minha mente ocidental pareceu estranho ver, por exemplo, dois casais bem vestidos a fazer sala de chinelinhos de quarto nos pés (ainda que sempre a condizer com a roupa), mas, de fato, faz todo o sentido não levar toda a sujidade e bichesa da rua para dentro de portas e, diria, que é um hábito que devíamos adotar todos.
As longas pausas entre falas são um artifício usado na ficção em geral para chamar a atenção para o que acabou de ser dito ou para o que não está a ser mencionado, mas os amigos lá da Coreia transformaram-nas numa arte. Algumas chegam a ser desconfortáveis, de tão compridas, mas é um gosto adquirido, diria.
E, depois, temos a dedicação às boas maneiras que os fazem tratar todos por senhor e senhora, inclusivamente, os seus inimigos, em plena discussão (verbal ou física, não importa). Não que não hajam pessoas más por aquelas bandas, apenas que é algo tão enraizado na cultura que lhes é instintivo fazê-lo.
Já a comida tem sempre tão bom aspeto e uma forma tão específica de ser apresentada (tudo separadinho em taças diferentes, como eu gosto!) que até eu, uma esquisita profissional, fiquei com vontade de experimentar.
Posto isto, ando a ver se encontro outro sermão que me luza o olho para dar continuação à minha conversão. Aceita-se sugestões.
Pessoas com deficiência somos todos nós. Todos temos as nossas especificidadezinhas, sim, mas também estamos todos a uma ultrapassagem arriscada, a uma queda no chuveiro, ou a uma doença súbita de passarmos a ter necessidades especiais.
A falta de acessos, seja na via ou em edifícios públicos, é tão flagrante que é apenas mais um problema escondido à vista de todos, mas e todas as atividades de lazer que ficam por fazer porque a chatice não justifica o trabalho?
Todos os concertos ou peças de teatro que ficam por assistir porque envolvem todo um espetáculo só para que o espetador assuma o seu lugar; todos os filmes que ficam por ver porque não há legendas a acompanhar a história; todas as pessoas impedidas de participar cívica e culturalmente na sua própria sociedade.
O teatro municipal do meu concelho, por exemplo, foi remodelado há poucos anos e tem bons acessos às instalações e lugares definidos para pessoas com necessidades especiais (ainda que não tenha conhecimento que disponibilizem sessões para pessoas com problemas auditivos ou de visão), mas é necessário assegurar que o acesso à cultura esteja garantido para todos e em todo o lado (ainda que não, necessariamente, ao mesmo tempo).
Está, neste momento, a decorrer uma petição, que ainda necessita de assinaturas para chegar à Assembleia da República, a pedir que seja garantida a acessibilidade plena nas salas de cinema em Portugal e eu já assinei. Deixo aqui o link para a petição para que se possam informar e, espero, para a assinar, também.
P.S. - Enquanto escrevia este texto, encontrei um artigo, aqui mesmo no Sapo, que merece uma leitura atenta: "A deficiência não é limite: aqui o cinema é para todos - "Cinema com Sentido" é o mote que leva a Fundação MEO a alargar a parceria com a AMPLA, que promove a inclusão na cultura."
Não das que inspiraram a Liliane Marise a compor o seu single de sucesso, mas daquelas que podem salvar vidas.
Faz hoje 105 anos que nasceu o médico Americano Henry Heimlich, a quem se atribui a invenção da manobra que foi batizada em sua honra - foi mas deixou de ser, após várias polémicas protagonizadas pelo senhor (incluíndo a sua tentativa de rotular as pancadas nas costas como prejudiciais nestas situações).
No entanto, é como a maioria de nós reconhece a manobra utilizada em casos de obstrução das vias aéreas (engasgamento) e continua a ser utilizada, ainda que as recomendações tenhas sido atualizadas.
Ora, então, o que devemos fazer em caso de obstrução das vias aéreas?
A pessoa está consciente? Consegue falar e respirar? Então, devemos encorajá-la a tossir para que o objeto se desloque por si (sem levar a mal que a pessoa não coloque o braço na frente da boca);
A pessoa está consciente, mas não consegue falar ou respirar? Então, temos de agir. Uns lábios em tons de azul nunca serão uma questão de moda:
- De pé, ao lado da pessoa, começem por apoiar uma mão no seu peito, inclinando-a para à frente, e, com a outra, apliquem 5 pancadas nas costas, entre as omoplatas, de forma a deslocar o objeto;
- O objeto saiu? A pessoa consegue respirar normalmente? Ótimo, podem parar as pancadas;
- A obstrução mantém-se? Então, há que abraçar a pessoa por trás, cerrar um dos punhos e colocá-lo entre o umbigo e o meio da bariga, colocar uma mão sobre a outra e, dobrando a pessoa para a frente, puxar as mãos para si e para cima e fazer 5 compressões abdominais;
- Resultou? O objeto saiu e a pessoa já consegue falar e respirar? Excelente!
- Caso contrário, deve-se continuar a administrar as 5 pancadas intercostais e as 5 compressões abdominais, de forma alternada, até à recuperação, e pedir ajuda;
- Se, eventualmente, a pessoa perder a consciência, devemos colocá-la no chão em seguança e ligar para o 112;
- E se parar de respirar, terão de ser, imediatamente, iniciadas manobras de suporte básico de vida, por quem tenha formação para tal.
*nos bebés, nas grávidas ou nas pessoas mais fortes, as compressões abdominais devem ser substituídas por compressões torácicas (como explicado nos links do INEM abaixo);
*o ideal é sempre ter formação específica para realizar estas manobras, mas, numa situação de emergência, é preferível agir a deixar que o pior aconteça.